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Morava nessa rua, logo na esquina debaixo, da Rua Arcipreste Paiva com a Vidal Ramos Catarina e sua filha, Antonieta de Barros, nascida 11 de julho de 1901. A casa se tornou uma pensão para dar conta do sustento dos filhos, que já eram três e Catarina, segundo os registros históricos, era possivelmente sozinha.
Catarina era lavadeira, afrodescendente empregada da família Ramos. Veio para a capital de Lages quando Vidal Ramos foi eleito vice-governador, conhecendo o jardineiro Rodolfo Barros, pai de Antonieta.
Aos 5 anos, a pequena Antonieta começou sua trajetória de alfabetização. Em 1917 entrou no curso Magistério. Todos os seus estudos foram conquistados provavelmente com muito sacrifício, devido às suas raízes humildes e, ainda, afrodescendentes, numa sociedade que ainda vive resquícios da séculos de escravidão. Possivelmente recebeu ajuda de algum amigo da família para lhe pagar os estudos.
Mas essa não é apenas a história de uma menina negra que conseguiu se formar nos estudos. Nos anos de 1920, a família de Antonieta se mudou para outra casa, na Rua Fernando Machado, onde fundaram uma Escola Primária, o Curso de Antonieta de Barros. Antonieta passou a se dedicar para o magistério, acabando por conquistar reconhecimento entre as elites e a população local. Entrou no Centro Catharinense de Letras, fundado em 1925, aproximando-se dos nomes da literatura catarinense e circulando junto a grupos políticos.
Em 1929, estreou uma coluna no jornal Folha Acadêmica sob o pseudônimo Maria da Ilha chamado Farrapos de Ideias. Escrevia crônicas sobre questões relacionadas à educação, política, cultura e preocupações que via em seu contexto, publicados também em outros jornais.
Na década de 1930, houve um engajamento por parte dos intelectuais brasileiros para pensar questões culturais e educacionais do país: Antonieta já era considerada uma intelectual. Outros afrodescendentes também fomentaram uma intelectualidade negra no começo do século como: Ildefonso Juvenal da Silva, Trajano Margarida, João Rosa Júnior, Amália Efigênia da Silva, Maria da Rosa Lapa, Demerval Cordeiro dos Santos, Maria Carlita, Dorvalina Machado Coelho e Maria Venância de Farias Martins.
Antonieta foi convidada para integrar ao Partido Liberal sendo eleita Deputada Estadual em 1934. Foi a primeira mulher negra a assumir um cargo de tal importância no estado de Santa Catarina, e ao que tudo indica, no Brasil. Em 1937, devido à ditadura implementada no país por Getúlio Vargas, a Assembléia foi fechada e ela voltou a se dedicar ao Magistério, tornando-se diretora do Instituto de Educação Dias Velho, professora de Português e Psicologia no Colégio Coração de Jesus e Diretora no Colégio Catarinense. Em 1948, foi empossada Deputada Estadual, desta vez pelo PSD.
Antonieta trabalhou na Assembléia Legislativa, localizada na Praça Pereira Oliveira, que pode ser vista da onde estamos. A Assembléia sofreu um incêndio 1956. Podemos ver nas fotos como ela era enquanto olhamos para a Praça:
Ela morreu em 1952 com 51 anos, muito jovem. Antonieta de Barros representou a quebra de esteriótipos relacionadas à classe social, gênero e etnicidade, tabus que até hoje estão muito vivos na sociedade e que, nas décadas de sua existência, estavam ainda mais. Ela ocupou espaços públicos de fala, reforçando a presença das mulheres em espaços majoritariamente masculinos, abrindo inéditos caminhos na história política do estado e do país.
A importância de Antonieta numa das memórias dos anos 1950 da cidade... “Cinquenta mil habitantes. Tempo de guerra. Escuridão. Vento sul. Bar e restaurante Pérola. Nereu. Sessão das Moças. Footing na Felipe Schmidt. A banca do Beck. Bela Vista. A Deusa de Jobá. Estampa Eucalol. Blackout. Gooool do Avaí. Radio Guarujá. Missa das dez. Emulsão de Scott. Prezado conterrâneo. Hotel Laporta. O ESTADO. Juiz ladrão. Stepô. Nazismo. A cobra fumando. Capitoa. Gentil senhorinha. É tão curtinho, coladinho, avantajado que me deixa abafado. Amar foi a minha ruína. Confissões com o padre Werner. Missa e comunhão. [...] Missa do Galo. D. Antonieta de Barros. A empada do Chiquinho. Sessão das Moças. Carro Alegórico. Osni Ortiga. Carro da Praça. Adolfinho. Saído do Hoepcke (O navio). Comandante Vecchietti. Tem gato na Tuba. Fanfarra da industrial. Roy Rogers. Bala uva do norte. 29 morrem no Cambirela. Comícios. Voltem na próxima semana.” Raul Caldas Filho, Desterro Década de 40.
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Caso você tenha chegado aqui agora e quer continuar descobrindo histórias da cidade, você pode escolher fazer o Roteiro Geral ou o Percurso Estruturas, indicados. Para conhecer mais sobre o projeto, clique aqui.
Continue na Rua que está, em direção à Igreja Nossa Senhora do Rosário. Aproveite para observar esta pequena Igreja e imaginar o que ali se passou séculos atrás. Observa também a vista da escadaria, onde no horizonte o mar já esteve perto. Desça as escadas e, no pé da escada, procure numa caixa de luz e muros grafitados o próximo ponto do roteiro geral.
Vamos até a Praça XV. Desça na Rua Arcipestre Paiva, passe por onde Antonieta morou e que hoje é um prédio, entre na Praça XV. Vá até a altura da Figueira e saia da Praça na calçada em frente à Casa de Câmara e Cadeia. Nessa calçada, ao lado da Rua dos Ilhéus, procure num poste o próximo ponto do percurso vidas.
Este texto foi elaborado com base nas seguintes pesquisas:
Um desejo infinito de vencer: o protagonismo negro no pós-abolição, artigo por Petrônio Domingues publicado na Topoi. Veja no link.
Antonieta de Barros: uma História, dissertação de História por Karla Dahse Nunes. Veja no link.