ATENÇÃO! VOCÊ ESTÁ NO
Francisco Kunzer, “seo Chiquinho”, dava os retoques finais na confeitaria que iria abrir no casarão colonial erguido nesta esquina, exatamente onde se localiza hoje a Livraria Catarinense, por volta de 1904. O ambiente misturava produtos importados, como vinhos, charutos e azeitonas, atrações culturais e grupos da intelectualidade da cidade.
Segundo crônica publicada no jornal A Gazeta em 1954: “Ali reuniam-se as rodas literárias que deram o que fazer aqui na província. A orquestra organizada por Hugo Freiesleben em que figuravam pessoas da nossa melhor sociedade como Sebastião Vieira e João Barbosa, situada num coreto em um canto no alto, vinha no compasso alegre de uma valsa abafar os ânimos exaltados pelas tertúlias literárias. A orquestra do Sr. Hugo Freiesleben marcou época e encantava as noitadas do Chiquinho”.
Nos anos 1920 o novo proprietário Theodoro Ferrari ganhou na loteria e investiu alguns bons contos de réis numa grande reforma. O novo Chiquinho foi reinaugurado em 1924 na edificação que vemos aqui hoje. Se você se afastar um pouco e olhar para a fachada da construção, ainda encontra os resquícios do antigo Chiquinho.
No andar térreo, funcionava a confeitaria, no segundo, um restaurante e no terceiro, o escritório do negócio, que mais tarde passou a ser a sede da rádio Guarujá. A reforma acompanhou a onda modernizante que a cidade vivia nos anos 1920, junto à obras como a Ponte Hercílio Luz e o Trapiche do Miramar. A rádio instalada no prédio possibilitava que os moradores ouvissem as notícias do país. Os anos se passaram e o cardápio, antes com doces, tortas e licores finos, passou a vender lanches rápidos. Foi quando as empadas de camarão ficaram famosas.
Quer cozinhar a empadinha do Chiquinho? Numa reportagem publicada em 25 de outubro de 1981, no jornal O Estado, o jornalista Paulo Barros apontou que Ferreira, o continuador das empadas da confeitaria, chamou seu cozinheiro e sua filha e informou que a receita seria publicada no jornal, da seguinte forma: “Meio quilo de banha suína, uma colher de sopa rasa de sal, um quilo e meio de farinha de trigo, dois copos de água, uma azeitona (para cada empada), e o camarão misturado na massa. Em seguida levar ao forno”.
Em frente a confeitaria ficava o Café Ponto Chic, mais conhecido como Senadinho, que até hoje funciona, inaugurado no dia 28 de março de 1948. Nesse período, muitos outros cafés e confeitarias foram abertos na cidade, como o Bar do Príncipe, onde hoje é o Bradesco, o Miramar, o Bar do Rosa, Poema Bar, Bar Primeiro de Maio, Bar São Pedro, Café Nacional, Café São Cristóvão, Confeitaria A Soberana... eram sinais da “modernidade”.
Em 1967, a Confeitaria do Chiquinho foi fechada. O poeta local Hermes da Fonseca publicou no jornal A Gazeta o poema “O Chiquinho vai fechar”: “Era uma casinha verde, baixinha e de beral; como que, do nosso mundo, era ela a capital... de mármore eram as mesas, e de palhinha as cadeiras; assim era o Chiquinho das nossas horas fagueiras. Ali se estava à vontade; Na distante mocidade, - velhos tempos que lá vão - Era, a querida casinha Como pequena irmãnzinha, Que traz no coração. Mas, era cheia a um só tempo, de encanto e amargura (como diria Bilac: esplendor e sepultura) Uns carpir suas mágoas iam, outros iam ali para sonhar Com suas bem-amadas, felizes se embriagar... (...) O nosso segundo lar – (embora paradoxal) No coração às vezes, sentia-se aljofarado, E noutras, atravessado por acertado punhal. Com empadas afamadas... - deliciosas empadas - Provocavam nostalgia.(...) Os vinhos velhos gelados Lá do estrangeiro importados. Era tudo uma beleza Assim era o Chiquinho Onde a gente era feliz... (...) Mudaram os tempos, porém, e o Chiquinho cresceu.... a casinha pequenina, ficou mais perto do céu; cresceu apenas por fora, por dentro se apequenou, tudo aquilo que era bom com o crescer se acabou. Mas não podemos lutar contra o surto do progresso. Contra as leis da evolução, Embora profundamente, Sintamos cá no recesso, Dolorido o coração. Temos que concordar... (e não há que relutar) Com a quebra da tradição. O Chiquinho vai fechar... O restaurante e o bar; Concedamos perdão, Inda que seja arrombar, As portas do nosso lar, - Doce lar do coração!”
Próxima parada
Caso você tenha chegado aqui agora e quer continuar descobrindo histórias da cidade, você pode escolher fazer o Roteiro Geral ou o Percurso Estruturas, indicados. Para conhecer mais sobre o projeto, clique aqui.
Siga reto toda vida na Rua Trajano, até chegar no Largo da Alfândega. Procure uma Estrutura de Concreto que parece um banco, na Praça do Largo, ao lado dos quiosques de artesanato e bancos semi-circulares de concreto. Se é dia de feira, geralmente ao lado há uma barraca de plantas e flores.
Suba na Rua Trajano em direção à escadaria do Rosário, dobre à direita na Rua Tenente Silveira e siga reto até a Igreja da Matriz. Ao lado da Igreja, entre à esquerda na Rua Padre Miguelinho, e procure a Casa de Esquina dessa Rua com a Anita Garibaldi, à direita, atual Casa da Memória. No paredão da construção, você encontrará o próximo ponto.
Este texto foi elaborado com base nas seguintes pesquisas:
Vida noturna e cultura urbana em Florianópolis (Décadas de 50, 60 e 70 do século XX) dissertação de História por Glaucia Dias da Costa. Veja no link.
“Toda cidade tem seu cantinho, e em Floripa foi o Ponto Chic”: sociabilidade, transformações urbanas e experiências no Café Ponto Chic”, artigo da Revista Santa Catarina em História por Isabella Cristina de Souza. Veja no link.
Reportagem Confeitaria do Chiquinho, 112 anos de encantos e amarguras, publicado no site Caros Ouvintes. Veja nolink.
Praça XV Espaço e Sociabilidade, por Elisabete Coradini, livro publicado em 1995 Ilha de Santa Catarina, livro iconográfico por Gilberto Gerlach publicado em 2015, Tomo I e II