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Em dezembro de 1844 provavelmente passou por aqui o africano livre Francisco de Quadros, que ia em direção à Igreja Nossa Senhora do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos. Ia participar da Irmandade da qual era irmão e juiz. Ele vinha provavelmente da Rua da Palma, onde era sua casa, ou da rua da Tronqueira, onde tinha uma morada de casas ocupada por lavadeiras, ou da Rua da Paz onde alugou terrenos para colocar sua quitanda, ou até da rua do Senado, onde possuía um quarto de casa alugado.
Francisco era quitandeiro e pombeiro, natural da nação benguela, que dizia respeito à região da África Central Atlântica, particularmente a um porto de embarque de africanos escravizados, o porto de Benguela. Foi dali que vieram o maior número de africanos escravizados para Santa Catarina, que, entre 1788 a 1850, nos livros de batismo da Freguesia de Nossa Senhora do Desterro, foram identificados e sistematizados 5.245 registros de batismos de escravos.
Vivendo a legitimidade da escravidão, Francisco também tinha escravos. Uma crioula que foi batizada em 1826 por dois escravos, Domingos e Esperança e a escrava Joaquina. Francisco teve ainda filhos do relacionamento com Joanna Rosa da Conceição, mulher crioula de condição forra.
Mas além de pai, senhor de escravos, forro, quitandeiro, Francisco fazia parte da Irmandade da Nossa Senhora do Rosário de uma forma especial: fora três vezes o Juiz, o cargo mais relevante da Irmandade, conquistado por eleição e por um homem preto que tinha procedência africana e a experiência de escravidão. Também foi Irmão de Mesa 12 vezes, Procurador da Irmandade uma vez e Procurador de Caridade duas vezes. Nas irmandades, os “homens pretos” se reuniam dentro de normas católicas que de alguma forma permitia que africanos e crioulos se ajudassem e se cuidassem, estabelecendo laços.
As irmandades surgiram na Europa durante a Idade Média para devotar a um santo, agregando as pessoas leigas a fim de realizar atividades de ajuda aos pobres e doentes. No Brasil se estabeleceram com características próprias proporcionando associações corporativas que estabeleciam laços de irmãos. Era comum encontrar as irmandades das “elites brancas” e a dos “homens de cor”, divididos entre crioulos, mulatos e africanos.
Francisco, afinal, era africano forro, mas possuía certa honra, mesmo que diferente do sentido de honra entendido pela sociedade da época. As relações que estabeleceu, os vínculos que fazia, além dos negócios, possibilitavam algo que poucos de sua condição talvez experienciaram.
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Continue na rua Trajano em direção ao mar. Quando chegar na segunda esquina, com a Rua Tenente Silveira, procure à sua esquerda numa caixa de luz grafitada e colorida o próximo ponto do roteiro geral.
Suba a escadaria do Rosário e aproveite a vista, que um dia foi mais próxima do mar. Vire à direita em direção ao Teatro Álvares de Carvalho. Na esquina dessa rua, a Marechal Guilherme, com a Arcipreste Paiva, procure no poste o próximo ponto do percurso vidas.
Este texto foi elaborado com base nas seguintes pesquisas:
A Irmandade do Rosário e seus irmãos africanos, crioulos e pardos, por Claudia Mortari Malavota, publicado em História Diversa, africanos e afrodescendentes na ilha de Santa Catarina
Ilha de Santa Catarina, livro iconográfico por Gilberto Gerlach publicado em 2015, Tomo I e II