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Alexandrina provavelmente andou bastante pelas ruas e travessas que contornavam o Rio da Bulha, coberto hoje pelo calçadão da Hercílio Luz, como a Rua das Olarias, Rua da Tronqueira, Rua São Martim, Beco dos Sujos… todas perto do Hospital de Caridade e da praia Menino Deus.
Era no Rio da Bulha que as lavadeiras, as amas-secas, as amas-de-leite e as parteiras geralmente se encontravam, trabalhando e conversando, fazendo seus serviços, seus negócios, suas vidas. Daqui podemos ver o atual Hospital de Caridade, quase sem edificações nas suas imediações como hoje:
As amas não necessariamente davam os peitos para as crianças, mas auxiliavam na criação, o que fazia com que as mães verdadeiras deixassem suas crianças nas suas portas, pois sabiam que estas ganhariam dinheiro para isso. Assim, as mães não perdiam sua honra, o que era importante para um casamento e as amas viam nessa atividade uma forma de sustento, criando uma rede de solidariedade com outras mulheres.
Alexandrina, afro-descendente, morou na Rua Menino Deus entre 1884 e 1887. Antes morava em Biguaçu. Veio para cá para exercer um de seus ofícios: ama-de-leite e ama-seca. Assim, foi para perto do Hospital de Caridade, talvez para ficar próxima das crianças abandonadas e tentar criar as mesmas com objetivo de receber gratificações do município. Primeiro, ela encontrou a criança Horácio, que acabou logo morrendo. Depois, encontrou Paschoa Lessa, que foi morar com ela, possibilitando que ganhasse 2$400 mil réis da prefeitura.
As amas, na época, transitavam entre o hospital e as suas próprias casas, levando consigo seus saberes próprios em reação ao corpo e as crianças. Elas geralmente também eram benzedeiras, benzendo-se, por exemplo, quando o seio endurecia. Eram saberes de matrizes culturais populares que faziam parte da rede de saberes das mulheres, como das parteiras e benzedeiras, passados de geração a geração e garantindo a sobrevivência de muitas mulheres no contexto.
Por exemplo, haviam as amas que, diferente do caso de Alexandrina, exerciam seus ofícios nas casas dos senhores. Muitas vezes tinham que dar a luz a crianças indesejadas para terem leite. Podiam ver até um estupro do seu senhor como algo proveitoso para seu ofício...
Na virada do século XIX para o XX, Desterro, já Florianópolis, viu as autoridades buscarem tornar a cidade mais limpa e higiênica, tanto fisicamente quanto socialmente. Haviam muitos ex-escravos que trabalhavam nas ruas como ambulantes e muitos desempregados, o que preocupava as elites que visavam a ordem do meio urbano. A medicina social passou a criar condutas morais para que os saberes e os cuidados com a saúde e a doença passassem a ser cada vez mais racionalizados e especializados. As proibições às parteiras e benzedeiras, especialmente, datam já o século XIX… assim, saberes de mulheres como Alexandrina foram sendo esquecidos e muitas vezes reprimidos.
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Siga na Hercílio Luz, sentido oposto ao mar, e entre na Rua João Pinto. Logo no começo da rua, quase na esquina, procure num poste o próximo ponto do roteiro geral.
Este texto foi elaborado com base nas seguintes pesquisas:
Bordados do Destino: Saberes das mulheres afro-descendentes, na passagem do século XIX ao XX, na capital de Santa Catarina, Juliani Moreira Brignol. Veja no link.
Ilha de Santa Catarina, livro iconográfico por Gilberto Gerlach publicado em 2015, Tomo I e II